Capítulo 0905 - O Monstro

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Enquanto o anúncio sobre os clones era feito, na vastidão do deserto de Gard, que se estendia como um mar dourado sob o céu límpido, pontilhado por poucas nuvens, Gu Ren e seu grupo avistaram as muralhas do Palácio das Areias, um monumento de esplendor e força que refletia a grandiosidade do reino de Hakim. Aquele não era apenas o lar do homem conhecido como o Rei de Gard, mas também o centro de sabedoria e estratégia que sustentava um dos reinos mais antigos de Decarius.

Dentro do palácio, o ambiente estava carregado. Hakim, com sua presença marcante, estava reunido na sala de audiências principais, um local decorado com tapeçarias luxuosas e históricas de Gard. Ele andava de um lado para o outro, enquanto seus conselheiros e guardas observavam em silêncio. A notícia de que um clone dele havia liderado o ataque a Hill havia chegado, e ele esperava ansiosamente pela chegada de Gu Ren e seu grupo para esclarecer os detalhes.

Quando as grandes portas da sala se abriram, Gu Ren, acompanhado de Cruz, Singrid, Ye Yang e Ragnar, adentraram o salão. Eles estavam cansados da viagem e dos esforços para ajudar os feridos, mas suas expressões continuavam sérias e resolutas. Jaha já estava presente, sentado ao lado de seu mestre. Com seu olhar astuto, o homem mais inteligente do mundo e sua mente brilhante era uma das principais armas de Gard e da própria humanidade contra qualquer ameaça.

Hakim, ao ver os recém-chegados, interrompeu sua caminhada e se aproximou rapidamente. Seus passos eram firmes, mas carregados de preocupação: “Gu Ren, finalmente. Precisamos falar. Quero saber exatamente o que aconteceu em Hill.”

Gu Ren fez uma reverência leve, mas direta, e respondeu com sua voz refletindo a gravidade da situação: “Rei Hakim, o que vou lhe contar não será fácil de ouvir. Mas é importante que saiba de tudo.”

Os membros do grupo se acomodaram em um semicírculo diante de Hakim e Jaha, enquanto Gu Ren começava a relatar os eventos. Ele descreveu o ataque em detalhes: Como o clone de Hakim apareceu ao lado dos clones de Yang Yin e Yang Fen, como eles massacraram a divisão de Hill sem piedade, e como a brutalidade foi tão calculada que parecia uma mensagem direta de destruição.

Em determinado momento, Cruz interveio, acrescentando com sua voz carregada de indignação: “Eles não só atacaram. Eles estavam ali para desmoralizar e semear o caos. Usaram sua imagem, Hakim, porque sabiam do impacto que isso teria. Eles queriam dividir as nações e desacreditar a aliança que estamos tentando formar.”

Hakim ouvia em silêncio, mas a tensão em seu rosto era evidente. Seus punhos cerrados tremiam levemente, e sua aura, normalmente controlada, começava a fluir de forma perceptível pela sala. Ele estava irritado. O Olho, a organização que nasceu em Gard e floresceu quando seu pai devia ter erradicado antes que se tornasse o monstro que é hoje, era sua maior fonte de frustração, e acabar com ela era o seu maior objetivo.

Hakim, depois de aprender com o Rei Salomão a sabedoria para governar e conseguir a força para lutar, queria ter destruído o Olho assim que voltou da Singularidade, mas os inúmeros problemas da humanidade atual e em sua própria casa o frearam e colocaram ele na posição desagradável de ter que apenas reagir ao que eles faziam.

“Esse ataque foi um movimento calculado do Olho, para nos forçar a revelar a verdade sobre o clones.” Jaha, olhando para Hakim, para aconselhá-lo, comentou, com sua voz calma e analítica: “Eles sabiam que usar você, Hakim, causaria uma ruptura no equilíbrio político de Decarius. A figura de um líder atacando uma nação vizinha… É exatamente o tipo de ação que planta sementes de desconfiança.”

“E os impactos vão além de Decarius… A desconfiança interna se multiplica exponencialmente à medida que nos afastamos daqui. Os nossos aliados lá fora, em outros planetas, se juntaram a nós porque viram força, segurança e um alinhamento de ideais.”

“Nós podemos contar nos dedos aqueles que se aliaram apenas para se vingar dos deuses e que estão dispostos a caminhar conosco sem qualquer contrapartida. Nossas alianças, infelizmente, são fracas. Elas não foram maturadas pelo tempo, pelos exemplos e pelas ações de cooperação mútua.”

“Com esse elo muito frágil nos unindo, qualquer distúrbio na nossa força, e principalmente na nossa coalizão, vai iniciar uma debandada.”

“Se nós não somos capazes de colocar ordem nas nossas próprias casas, como cuidaremos deles?”

“Some isso à crise com os orcs, onde já nos colocaram em uma situação de confronto com um aliado declarado, e nossa credibilidade foi de cem a zero em um estalar de dedos.”

Jaha permaneceu se calou por alguns segundos. Sua expressão era séria e pensativa, mas após aquela pausa, sua voz mantinha a calma característica de alguém que analisava cada detalhe com precisão matemática.

“O impacto desse ataque vai muito além do que vemos agora. Como mencionei, nossos aliados internos e externos já estão em um estado de fragilidade. E, em situações assim, o caos não apenas ameaça, mas se propaga como uma doença.”

Ele se levantou caminhou lentamente pela sala, olhando para cada membro presente antes de continuar: “Imagine o cenário mais provável. A notícia do ataque se espalha. Mesmo com o pronunciamento feito pela Dinastia Yang e pelo Vale da Esperança, a dúvida já foi plantada. Alguns aliados confiarão em nós, mas outros, principalmente os mais distantes, hesitarão. Eles se perguntarão: ‘Se eles não conseguem controlar seus próprios líderes, como podem garantir nossa segurança?’.”

Gu Ren assentiu, concordando com a análise: “É exatamente isso que o Olho quer. Não é só a destruição física, é a manipulação psicológica. Eles usam o medo para corroer a confiança.”

Jaha continuou, desta vez focando em Hakim: “E agora, vamos para o segundo cenário. Você é, indiscutivelmente, uma das figuras mais poderosas e influentes de Decarius. Um rei com duas afinidades elementais, um talento que transcende gerações. Alguém que, sozinho, pode mudar o rumo de uma batalha. Você não é apenas um líder militar, mas um símbolo. Cloná-lo foi uma jogada inteligente. Para o Olho, sua imagem é uma arma militar e de manipulação social ao mesmo tempo.”

Hakim cerrou os punhos novamente, com a raiva evidente em seus olhos, mas ele não interrompeu. Jaha, percebendo a tensão crescente, suavizou o tom, mas continuou com sua análise lógica.

“Agora, o terceiro cenário. O Olho não parará por aqui. Eles já provaram que podem usar clones para atacar onde quiserem. Se usaram sua imagem uma vez, farão isso novamente, em locais ainda mais estratégicos. Imagine o impacto de um clone seu atacando uma aliança interplanetária ou mesmo outra nação que ainda está hesitante em nos apoiar.”

Jaha olhou diretamente para Hakim e, com um tom mais grave, concluiu: “Eles não estão apenas tentando nos dividir, mas isolá-lo. Se conseguirem destruir sua credibilidade, Hakim, você se tornará vulnerável não apenas como rei, mas como símbolo. E a queda de um símbolo é a queda de tudo o que ele representa. O que você está fazendo aqui será paralisado e o clima para que os simpatizantes do Olho reapareçam entre o seu povo vai se tornar agradável.”

“Eles não querem apenas semear o caos de forma descontrolada. Eles querem abrir caminho, ou melhor, repavimentar o caminho para a terra natal deles, onde suas raízes ainda são profundas, apesar de inertes no momento.”

“Eu jogaria assim se fosse eles. Uma cortina de fumaça atrás da outra, mas cada uma tem sua finalidade e um impacto igualmente forte. Nada do que eles fizeram foi a esmo. Tudo está conectado a uma ramificação de caminhos que levam a um mesmo lugar.”

“Se um plano falha, eles têm um plano B. Se o plano B falha, eles têm um plano C. E por aí vai.”

“A única forma de matar esse monstro é cortando a cabeça, mas ele se protege nos jogando em dilemas e nos forçando a tomar decisões e agir como humanos, enquanto o monstro… Bem… O monstro é o monstro!”

“Ele vai nos manter afastados dele, nos distraindo e dando problemas sempre mais urgentes, até que ele julgue estar pronto para atacar e devorar tudo!” Jaha completou, com um tom sombrio que revelava o quão profundas eram as raízes daquele tumor.