Capítulo UHL 1137 - A Sombra que Cobre Tudo
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Depois de Momoa aparecer com um pedido ou uma orientação tão inesperada, Zao Tian coçou a cabeça por alguns instantes, entendendo os motivos que o levaram àquilo, mas ainda com a mente bagunçada.
“Eu vou ser sincero…” Zao Tian disse, por fim, então respirou fundo, sem desviar o olhar nem abaixar a cabeça, e completou: “Eu preciso de tempo para digerir tudo isso.”
Aquilo não foi uma confissão de fraqueza. Foi só a verdade.
Daren assentiu devagar.
“Não é pouca coisa.” Ele comentou: “Nem para mim.”
Olhando, ele não parecia menos atordoado do que Zao Tian com tudo o que Momoa tinha relatado. A imagem de Zaki, reescrita daquela forma, remexia em lembranças que ele preferia manter encaixadas em gavetas simples e identificadas.
Mas Daren, diferente de Zao Tian, já tinha outra camada em mente. Um desvio do assunto, para tocar em um ponto que ele não podia deixar de comentar.
“E tem mais uma coisa…” Ele disse, mudando o ângulo da conversa, com a naturalidade de quem afasta um assunto sensível porque sabe que alguém está ouvindo: “Ele não para de me surpreender. Nem agora.”
“Ele quem?” Zao Tian perguntou.
“Gold.” Daren respondeu, olhando diretamente para o rapaz: “Você acha mesmo que ele não está escutando desde o início?”
Foi nesse momento que o clima mudou.
Zao Tian sentiu, primeiro, como sempre sentia: um peso diferente atrás da própria consciência, como se uma mão velha demais para ser medida tirasse devagar os dedos de sobre o ombro dele.
A energia que costumava ficar misturada à sua se reorganizou, como água saindo de um vaso para ocupar outro lugar.
Num instante, o corpo de Zao Tian ficou um pouco mais “sozinho”, pois no espaço ao lado dele, o ar se adensou, dobrando a própria presença até tomar forma.
Gold apareceu.
Nada de luz em excesso, nada de espetáculo. Ele simplesmente estava ali, como se sempre tivesse ocupado aquele ponto, e o mundo é que estivesse atrasado em perceber.
Daren acenou e sorriu.
“Você demorou.” Ele brincou.
Gold o encarou por um segundo e, então, deixou a sombra de um sorriso difícil de ler passar pelo rosto.
“Naquela época, eu surpreendia até a mim mesmo.” Ele respondeu, cordial e sem arrogância para com seu amigo de longa data,
Para Daren, aquele tom já dizia bastante. Não era o Gold insuportável que todos viam, nem o homem que negociou com Odin e depois pôs um fim em tudo. Era algo no meio, temperado com eras demais de responsabilidade.
Momoa, por sua vez, não perdeu tempo.
“Tio Gold.” Ele disse, com um aceno curto de cabeça.
O apelido saiu natural, sem esforço, carregando anos de uma história que os três ali conheciam.
Gold virou o rosto na direção dele, e, por um instante, a expressão endurecida pareceu ceder.
“Momo.” Ele respondeu: “Achei que você tinha ido se esconder na Singularidade para fugir do trabalho.”
A frase veio áspera, mas o fundo era diferente. Havia ali o tipo de familiaridade que só nasce entre aqueles que se gostam.
Momoa não se ofendeu.
“Se não fosse o trabalho que você me deu lá dentro, eu não voltava inteiro.” Ele devolveu: “Obrigado. Mesmo sabendo que, tecnicamente… não são os mesmos.”
Gold deu de ombros, como quem rejeita o peso do agradecimento, mas sem descartá-lo.
“O tempo faz cópias piores de todo mundo.” Ele falou: “O passado de alguém bom nunca é melhor do que o futuro.”
Zao Tian observava aquele intercâmbio com cuidado. Ver Momoa chamando Gold de “tio” e Gold chamando Momoa de “Momo” colocava a relação dos dois em um lugar que nenhum livro ou relato de guerra jamais teria mostrado.
Quando a troca de farpas suaves se assentou, ele aproveitou o momento.
“Eu tenho uma pergunta, pode ser?” Zao Tian disse, enfim, olhando para Gold: “Sobre o rio que você tocou.”
Gold imediatamente olhou para ele.
“É a pergunta que todo mundo faz.” Ele comentou, sem ironia: “Mas faça assim mesmo.”
“Ele é realmente tão diferente assim?” Zao Tian perguntou, indo direto ao ponto: “Tocar esse rio… muda tanto assim as coisas?”
A pergunta veio carregada de respeito. Não tinha cobrança. Tinha o peso de quem sabe que está cutucando um limite.
Gold não respondeu de imediato. Ele pensou alguns segundos, como se estivesse se lembrando ou ponderando se dizia ou não.
“Tudo muda.” Ele disse, por fim: “Não só a força… mas o entendimento. A forma como você vê os elementos, a energia espiritual, o próprio tecido do cosmos. A maneira como o fluxo entra e sai de você deixa de ser uma linha com começo e fim. Parece que o controle não tem borda, e que a fonte não se esgota.”
Zao Tian absorveu cada palavra. Era a primeira vez que Gold tocava em um assunto tão importante assim.
“Mas só parece.” Gold enfatizou: “Porque não quer dizer que seja infinito. Mas, do ponto em que você está agora, a sensação é essa.”
Ele cruzou os braços, sem se recostar em lugar nenhum.
“Eu gostaria de te responder com clareza, moleque, mas só que existe um problema.” Ele continuou: “É impossível descrever tudo isso de forma honesta. Como eu já disse ao Daren há muito tempo, certos segredos do universo não podem ser contados. Não porque eu quero escondê-los, mas porque não existem palavras suficientes para enfiá-los dentro da boca de ninguém. Eles só podem ser sentidos. Se alguém chegar lá, vai entender.”
Daren confirmou em silêncio. Ele lembrava daquela conversa. Na época, achou que Gold estava só sendo misterioso. Depois, percebeu que tinha mais coisa.
“Com todo respeito…” Zao Tian interveio: “Você é sempre enigmático quando fala sobre isso. Eu entendo que não dá para dizer tudo, mas… eu gostaria pelo menos de um mísero exemplo.”
Gold encarou por um instante, enquanto pescava da memória algo que podia ser descrito.
“Você quer que eu abra um cofre e jogue uma moeda na sua mão enquanto o resto do tesouro ainda está enterrado.” Ele disse: “Esse é o problema de revelar segredos para quem está perseguindo o tesouro. Às vezes, uma moeda é suficiente para fazer o sujeito largar a pá ou cavar no lugar errado.”
Depois de fazer aquela comparação, Gold deixou a imagem assentar na mente de Zao Tian.
“Imagine alguém escalando uma montanha.” Gold continuou: “Se você mostra o topo antes da hora, pode acontecer duas coisas ruins. Ou ele desiste, achando que nunca vai chegar lá, ou começa a pular etapas, achando que já entendeu a forma da subida. Nas duas, ele cai. E, quando cai de certa altura, não levanta igual.”
Zao Tian entendeu que, no fim, aquele misterioso todo era para o bem da evolução dele, mas naquele assunto, ele não recuou.
“Eu não quero ver o topo, Gold.” Ele afirmou: “Só quero entender melhor o que estou perseguindo. Nem que seja por um passo.”
Gold ficou em silêncio por alguns segundos. Ele avaliava não só as palavras e o pedido, mas a firmeza atrás delas e a vontade sincera de entender.
“Está bem.” Impressionantemente, ele cedeu: “Eu vou tentar dar um exemplo. Não como quem entrega um mapa. Mas como quem mostra um cheiro para você farejar.”
QUando Gold falou aquilo, Momoa e Daren calaram ainda mais, se é que isso era possível. Também, os dois se inclinaram na direção dele, como se enconstassem os ouvidos numa parede para escutar quem estava do outro lado.
“Uma das coisas mais marcantes que eu senti…” Gold começou um relato: “Foi a presença de almas. Muitas almas”
A palavra veio, e o ar pareceu afinar.
“Era diferente de auras… Não era só a alma das coisas vivas que estavam por perto.” Ele explicou: “Isso, de certa forma, você já experimentou em escala pequena. Eu também, mas quando toquei aquele rio, o raio mudou. Em um espaço de milhões de quilômetros, eu podia sentir a respiração de cada ser vivo. Não apenas humanos, não apenas bestas. Plantas, microrganismos, qualquer coisa que ainda estivesse presa à matéria de alguma forma.”
Ao escutar aquilo, Zao Tian engoliu seco. Só tentar imaginar algo assim já era demais.
“Mas havia outras almas ali.” Gold continuou: “Eram diferentes. Não estavam presas a um corpo. Não respiravam, mas gritavam. Ao mesmo tempo, pareciam felizes. Era paradoxal. Elas pediam socorro e agradeciam, no mesmo fôlego. Tudo o que tinham vivido parecia acontecer ao mesmo tempo. O primeiro passo, o último erro, a melhor lembrança, o maior arrependimento… tudo simultâneo.”
Ele abaixou levemente o queixo, lembrando.
“Eu as sentia perto e distantes ao mesmo tempo.” Ele disse: “Como se estivessem encostadas na minha pele, mas enterradas em uma profundidade que a minha visão não alcançava. Eu sabia que elas estavam ali. Sabia que existiam. Sabia que estavam em algum tipo de fluxo. Mas ainda não podia vê-las.”
“E o que você fez?” Zao Tian perguntou, sem conseguir segurar a pergunta.
“Eu simplesmente agi por instinto.” Gold respondeu: “Ou algo que parece instinto. Talvez fosse conhecimento que o rio acordou. Talvez fosse intuição. Talvez fosse uma combinação dos dois. Eu apenas fiz o que qualquer idiota curioso com poder demais faria.”
Ele ergueu um pouco a mão, como se repetisse o gesto.
“Eu estiquei o braço.” Ele disse: “E tentei segurar uma delas.”
O salão pareceu encolher ao redor de Gold. Mesmo Daren, alguém tão velho e sério, estava vidrado como uma criança que escuta uma história ao redor da fogueira.
“No momento em que eu encostei…” Gold prosseguiu: “Eu deixei de estar onde estava. Não no sentido comum, porque meu corpo continuou no lugar. Mas a minha consciência foi puxada para outro ponto. Um lugar que eu nunca tinha visto antes, mas que… fazia sentido, de um jeito que não cabia em nenhuma explicação.”
Ele então olhou diretamente para Zao Tian.
“Você já esteve lá.” Ele afirmou.
Zao Tian arregalou ligeiramente os olhos.
“Quando?” Ele perguntou: “Eu me lembraria de algo assim.”
“Nem sempre.” Gold retrucou: “Alguns lugares são grandes demais para a mente carregar com nitidez, e você não foi da forma que eu fui, também. Você esteve lá quando usou a Forja de Hefesto para forjar a sua Arma do Espírito. Você e seus amigos.”
Naquele momento, Zao Tian lembrou da sensação de estar em um espaço estranho, diante de formas que não obedeciam a nenhuma geometria comum nem ao conceito de tempo.
“Naquele dia, você pôs a ponta do pé no mesmo lugar em que eu entrei de cabeça.” Gold explicou: “Um rio em que silhuetas de energia falam, se movem e parecem vivas. Elas não são memórias. Não são simples ecos. São existências em trânsito.”
Daren fechou os olhos por um instante, como se sentisse um arrepio pela espinha.
“Quando eu segurei aquela alma…” Gold prosseguiu, sem mudar o tom: “Eu vi esse lugar pela primeira vez. Vi estruturas que não eram corpos, mas carregavam a sensação de pessoas. Vi linhas fluindo de um lado para o outro, como se cada linha fosse uma história inteira. E compreendi que o que eu estava tocando não era só um plano a mais.”
Ele deixou a frase cair.
“Era o rio das almas.” Gold disse: “O lugar para onde a existência de cada ser vivo que partiu retorna, para um dia, em algum ponto, reencarnar. Não como prêmio, não como castigo. Como um ciclo. Como parte da mecânica da vida que nenhum deus conseguiu quebrar.”
Ao escutar aquilo e sentir um pouco do que Gold se lembrava daquele dia, Zao Tian ficou imóvel.
A resposta que ele tinha pedido não era a que esperava. Ele queria um exemplo sobre controle, poder, elementos. Contudo, em troca, ele recebeu um vislumbre do que sustentava a própria continuidade da vida.
“Esse foi só um dos efeitos de tocar aquele rio.” Gold completou: “Um pedaço pequeno, perto do todo. E, mesmo assim, veja o que ele faz com você só de ouvir.”
De fato, a mente de Zao Tian se encheu de perguntas a cada frase que Gold dizia.
Zao Tian sentia que o chão continuava o mesmo, mas a escala de tudo tinha mudado de lugar. Ele e Momoa já tinham encostado de leve naquele rio, puxados pela Forja de Hefesto, com a alma arrastada por um ritual específico, cercada por limites que não entendiam. Agora, porém, ele estava ouvindo sobre alguém que tinha ido até lá por inteiro, quase como se tivesse um passe permanente entre dimensões.
A diferença de profundidade entre as experiências era tão grande que doía pensar nela.
Uma parte dele se apertou diante dessa distância. Outra parte, porém, se ajeitou. Saber que já tinha tocado aquele lugar, ainda que com a ponta do pé, tornava o impossível um pouco menos abstrato. O rio não era mais só uma metáfora ou uma história que Daren e Gold contavam com cuidado. Era um destino concreto, com cheiro, textura e forma.
Daren, por sua vez, sentia um misto incômodo de confirmação e desconforto. Tudo o que ele sempre suspeitou sobre o alcance de Gold ganhava corpo demais. O rio das almas, a reencarnação como mecanismo neutro, o trânsito entre planos… nada daquilo o consolava. Ele via, ali, um tabuleiro mais vasto do que qualquer guerra que já tinha travado. Ainda assim, ao mesmo tempo, havia um tipo de alívio em seu olhar, porque ele não tinha apostado errado em quem seguiu por toda a sua vida.
Gold realmente tinha ido muito mais longe do que qualquer outro.
Para Momoa, a sensação era outra. Ouvir o nome do rio das almas, depois de ter passado milênios comprimidos na Singularidade, colocava a própria jornada em outra perspectiva. Aquele lugar que ele tratava como o extremo absoluto deixava de ser o topo e virava… um degrau. Saber que, enquanto ele era jogado de um lado para o outro dentro de um loop construído, Gold já atravessava corredores que ligavam a vida e a morte em mão dupla era irritante, mas também consolador, porque isso dava um eixo para o qual mirar o resto da vida.
No fim, nenhum dos três saiu dali com respostas suficientes para matar as dúvidas. Eles apenas saíram com perguntas novas e com a certeza incômoda de que o rio que Zao Tian teria de alcançar não era só um limite de poder, mas uma fronteira entre planos que Gold já tinha cruzado. E, por mais pesado que isso fosse, era melhor do que caminhar às cegas. Agora, pelo menos, eles sabiam o tamanho aproximado da sombra que estavam perseguindo.
