Capítulo UHL 1143 - Tratado
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O clima que caiu sobre o salão após a reação de Zao Tian não foi nem de longe um acordo.
Foi uma inspeção.
Cada comitiva mediu Zao Tian como se estivesse avaliando uma arma encontrada no campo, tentando decidir se aquilo era uma ameaça real, loucura bem ensaiada, ou uma coragem burra que terminaria com sangue no chão.
Alguns o encaravam buscando o menor tremor de mão.
Outros procuravam rachaduras na voz que já tinha se provado firme.
Havia quem quisesse encontrar medo para poder rir.
Havia quem quisesse encontrar mentiras para poder atacar.
E havia quem, mesmo odiando humanos, reconhecia o que era mais raro do que qualquer diamante: alguém capaz de virar o foco do caos sem levantar o tom.
Shara’Kala sentiu o impacto como se fosse físico.
Ela conhecia os orcs. Conhecia o tipo de barulho que um salão daqueles produzia quando estava prestes a romper. Conhecia a forma como líderes reagiam quando alguém ameaçava a honra, a tribo, o sangue.
E ela nunca tinha visto nada parecido com aquilo.
Não ali.
Não com aqueles nomes.
Zargoth estava parado, ainda de pé, com o olhar duro, mas quieto de um jeito diferente, porque o peso de Uhr’Gal inteiro estava nas costas dele e, por um segundo, ele tinha percebido que o salão poderia romper mesmo sem ninguém atacar primeiro.
Vargan’Zul… não se mexia.
A fúria estava ali, evidente, mas ela não encontrava saída.
Como se até ele, que vivia de intimidação, estivesse tentando entender se tinha acabado de cruzar com alguém que intimidava de volta sem esforço.
Shara’Kala então olhou para Zao Tian.
E, pela primeira vez em muito tempo, ela não teve uma resposta pronta.
Ela sentiu inspiração, porque o gesto dele tinha sido insano e, ainda assim, limpo.
Sentiu espanto, porque orcs não se calavam daquele jeito sem motivo.
Sentiu admiração, porque ele tinha falado com líderes que ela mesma evitava confrontar de frente.
E sentiu apoio, quase involuntário, porque, naquele segundo, ela percebeu a diferença entre postura e presença.
O que ele tinha feito não era só levantar e ameaçar.
Era mostrar que não precisava provar nada pelo grito.
E isso fez uma pergunta surgir, sincera e incômoda, dentro dela.
“Qual é o verdadeiro nível desse homem?”
Ela tinha visto Zao Tian lutar.
Tinha visto decisões políticas dele.
Tinha visto ele vencer com inteligência, punho e frieza.
Mas aquilo… aquilo era outra forma de poder.
A forma que não se mede só por técnica.
A forma que se mede por convicção.
Por seriedade.
Por capacidade de sustentar uma frase horrível sem piscar.
Shara’Kala se perguntou o que ele escondia.
Não no sentido de um segredo barato.
No sentido de profundidade.
De teto.
De limite.
Porque alguém que fala como ele falou, naquele lugar, ou sabe que consegue cumprir… ou já aceitou morrer sem recuar.
E ele não parecia um homem preparado para morrer.
Parecia um homem preparado para tomar uma decisão, por mais difícil que fosse.
A calma dele era absurda.
Zao Rei, por sua vez, estava quase sem respiração.
Ele tinha ouvido os insultos.
Tinha sentido o próprio corpo pedir para sumir.
Mas, quando Zao Tian se levantou e partiu a mesa, o mundo dele reorganizou.
Não era só o irmão mais forte.
Era o irmãozinho que ele lembrava de outra época, agora em pé diante de uma sala inteira de monstros, falando o que ninguém ousava falar.
E, pior… falando como se fosse natural.
Zao Rei olhou para Zao Tian com um tipo de admiração que não tinha espaço para ironia.
Naquele instante, ele enxergou o irmão como uma figura impossível.
Como algo que não devia existir num mundo real.
Um super-herói.
Não pelos poderes, mas pela maneira como carregava o próprio peso sem tremer.
Zao Tian deixou o silêncio durar mais alguns segundos, e então, como se estivesse recolhendo o próprio excesso, ele soltou o ar devagar.
Fechou os olhos.
E a sala, que estava esperando o próximo golpe, ouviu uma coisa que ninguém esperava ouvir depois de uma ameaça de extermínio.
“Eu peço desculpas.”
Algumas sobrancelhas se ergueram.
Alguns rostos endureceram ainda mais, esperando sarcasmo.
Mas não havia sarcasmo.
Apenas… Sinceridade.
Zao Tian abriu os olhos lentamente e continuou, com o mesmo tom calmo.
“Eu não vim aqui para transformar este salão num campo de batalha.”
Ele passou o olhar pelos presentes de novo, agora sem ameaças.
“Eu estou estressado.” Ele disse.
Um riso curto quase escapou em algum canto, mas morreu antes de nascer, porque ninguém queria ser o primeiro a rir.
“Eu tenho lidado com o Olho, com os deuses, com guerras que não param de procurar Decarius, com alianças que podem desmoronar por uma frase mal colocada, e com o fato de que todo mundo aqui parece preferir morrer com orgulho do que viver com lucidez.”
Ele fez uma pausa curta.
“Eu não quero ver o meu povo machucado.”
Ele ergueu o queixo de leve.
“E eu também não quero ver o povo de vocês machucado.”
Alguns reagiram por instinto, como se aquela frase fosse impossível de acreditar.
Zao Tian, entretanto, não cedeu.
“Eu vou repetir o que importa.”
Ele deixou o peso da sala cair em cima das palavras, mas agora como um pedido, não como uma ameaça.
“Comecem a conclusão do tratado.”
Ele olhou para Zargoth, e o gesto foi claro: devolvia o centro das atenções.
“E tratem uns aos outros com o mínimo de respeito necessário para que isso não vire uma armadilha.”
Agora, o silêncio ficou diferente.
Ainda estava tenso.
Ainda estava cheio de hostilidade.
Mas agora havia uma fresta aberta.
Porque, por mais que odiassem admitir, muitos ali entendiam o que era estar no limite.
E aquele pedido de desculpas, vindo depois do estouro, não soou como fraqueza.
Soou como controle.
Zargoth foi o primeiro a se mexer.
Ele respirou fundo, como se puxasse para si de novo a responsabilidade de evitar que Uhr’Gal virasse uma manchete cósmica.
“Sentem.” Zargoth ordenou.
Alguns demoraram.
Mas sentaram.
Até Vargan’Zul, com um olhar que prometia vingança para alguém, em algum momento do futuro, cedeu ao gesto mínimo, porque sabia que continuar em pé seria declarar que o salão já estava perdido.
Zargoth apoiou as duas mãos na mesa quebrada, olhou para os pedaços e, sem perder tempo com teatro, puxou uma tábua lateral para a frente, improvisando o suficiente para seguir.
“O que foi dito aqui…” Ele falou, e o olhar dele passou por Zao Tian e depois varreu os chefes: “Já deixou claro que ninguém vai conseguir fingir que isso é uma conversa leve.”
Ele bateu a mão uma vez, para chamar o foco.
“Então vamos ao que viemos fazer.”
Ele ergueu a voz.
“Reféns.”
O ar mudou de novo.
Não por barulho.
Por gravidade.
Porque a troca de reféns era o tipo de coisa que ninguém aceitava sem entender o custo real.
E ali, o custo real tinha nomes. Tinha sangue. Tinha herdeiros.
Tinha filhas e filhos de líderes, irmãos de khans, sobrinhos de chefes de clã, sucessores óbvios e peças políticas que sustentavam alianças inteiras.
Zargoth olhou para um ancião orc do seu lado, responsável por registrar a ordem e confirmar que tudo seria cumprido sem margem para interpretação.
O ancião começou a anunciar, com voz firme, sem emoção.
“Tribo Khar’Mok, do planeta Ruun. Entrega: Hrukal, filho do líder de guerra, para a custódia do clã krovackiano Surn’Kai.”
Um murmúrio atravessou o salão.
O nome do refém era conhecido.
O clã krovackiano Surn’Kai era odiado pelos orcs de Ruun.
O recado daquela troca era claro: confiança não existia, e só podia ser garantida por ameaça.
A voz continuou.
“Clã krovackiano Surn’Kai. Entrega: Veshra, irmã do chefe de clã, para custódia da tribo orc Khar’Mok.”
Um riso nervoso ecoou em algum canto.
Alguém cuspiu:
“Agora sim.”
Nome a nome, a teia começou a se desenhar. E ela era abrangente demais para ser bonita.
Orcs entregando seu próprio sangue para krovackianos.
Krovackianos entregando seu próprio sangue para orcs.
Orcs entregando sangue para orcs rivais.
Krovackianos entregando sangue para krovackianos rivais.
Inimigos declarados recebendo o que tinham de mais valioso para segurar o outro pelo pescoço caso alguém quebrasse a palavra.
A cada anúncio, um pequeno foco de tensão surgia.
Um líder levantava a voz para contestar a ordem.
Outro exigia confirmação do grau de parentesco.
Uma comitiva ameaçava “não aceitar algum refém fraco”.
Outra chamava o refém de “moeda podre” só para ferir.
Mas, sempre que o tom escalava, Zargoth cortava com precisão, lembrando que não havia tempo para orgulho ali.
Vargan’Zul foi anunciado.
“Clã de Vargan’Zul.” O ancião disse, e algumas presenças se endireitaram. “Entrega: dois membros diretos de sangue.”
Um burburinho pesado.
Zargoth não piscou.
“Você quer paz…” Ele falou para Vargan’Zul: “Você paga como todo mundo.”
Vargan’Zul cerrou os dentes.
“Quem fica com eles?” Ele rosnou.
O ancião respondeu, e foi como jogar óleo no fogo.
“Custódia dividida. Uma tribo orc de Uhr’Gal e a humanidade.”
O insulto era explícito.
Eles não confiavam nele nem para se manter vivo sem tentar trair alguém no processo.
Vargan’Zul inclinou o corpo para frente, quase levantando de novo, mas parou quando sentiu o olhar de meia dúzia de líderes fixando nele ao mesmo tempo.
E, pior, sentiu o salão lembrar que Zao Tian ainda estava ali.
Calmo.
O ancião continuou.
Até o lado humano foi citado, porque o símbolo precisava existir no papel.
“Parte humana: Zao Rei, irmão de Zao Tian, permanece em Uhr’Gal sob custódia designada até a conclusão total dos marcos iniciais do acordo.”
Um coro de murmúrios veio, quase carroçando para o deboche.
“Refém humano sem cultivo.”
“Isso aí é garantia de quê?”
Zargoth bateu na mesa com força, cortando.
“Chega.”
Ele olhou para a sala.
“Vocês tratam sem cultivo como subespécie porque vocês gostam de medir o valor por força.”
Ele apontou o queixo para Zao Rei.
“É justamente por isso que ele tem valor aqui.”
Ninguém respondeu.
Porque, gostassem ou não, a lógica era cruel e verdadeira.
O ancião então passou aos termos.
“Paz: cessar imediato de hostilidades diretas entre as partes signatárias, inclusive ataques por procuração.”
“Respeito: reconhecimento de soberania territorial. Não haverá nenhuma incursão em território signatário sem uma solicitação formal.”
“Cooperação: rotas seguras serão garantidas; troca de informações sobre ameaças externas, e apoio recíproco em caso de agressão por terceiros.”
Alguém resmungou: “Terceiros… deuses.”
Um outro respondeu: “O Olho.”
Outro: “O Demônio.”
O ancião não parou.
“Quebra de palavra: a parte lesada fica livre para executar o refém que detém, sem impedimento, sem punição e sem necessidade de justificativa adicional.”
O salão ficou gelado por um instante.
O tipo de frio que só existe quando todo mundo imagina, ao mesmo tempo, a lâmina encostando no pescoço de alguém importante.
Zargoth então ergueu a mão, e a parte final aconteceu com o peso que precisava ter.
“Está dito.” Ele falou. “Está registrado. Está ouvido.”
Ele varreu o salão.
“Quem quer selar, entregue os reféns anunciados imediatamente.”
Alguns líderes ainda estavam com o orgulho inflamado.
Outros estavam com raiva.
Mas, diante do que tinha sido colocado na mesa, a maioria já entendia que a alternativa era simples demais: ou aceitavam, ou a guerra voltaria a ser o idioma único.
Um por um, eles foram entregando.
Com palavras curtas.
Com gestos bruscos e relutantes.
Com ódio no olhar.
Mas entregando.
Até que o salão, que tinha começado cheios de ameaças, virou um documento histórico.
E, no fim, quando a última entrega foi feita, Zargoth soltou o ar como se tivesse segurado o planeta por alguns minutos.
“O tratado está consolidado!” Ele afirmou.
O clima que veio depois, quando as tribos começaram a sair com os reféns que receberam, não foi paz.
Ainda não.
Mas foi a primeira vez, em muito tempo, que parecia existir um caminho em que a guerra não era inevitável.
Zao Tian permaneceu em pé por um instante, olhando para as comitivas.
Shara’Kala, ao lado, ainda estava tentando entender de onde vinha aquela calma.
Zao Rei estava com o coração acelerado, agora sabendo que tinha atravessado um ponto sem volta.
E, no centro da sala, cercado por inimigos e aliados temporários, o tratado enfim existia.
Rígido.
Brutal.
E real.
